Por Maíra Brandão
A Cultura enquanto lugar de encontro, não apenas com o/a outro/a, mas como espaço-tempo que proporciona a cada indivíduo o encontrar-se consigo mesmo/a. Para Bruna Gomes Ferreira, ex-jovem monitora e moradora do Morro Doce, na Zona Noroeste de São Paulo, o Programa Jovem Monitor/a Cultural (PJMC) foi uma dessas janelas que proporcionam realização.
Desde a primeira infância, Bruna foi envolvida em atividades como capoeira, teatro, dança e música. Já uma jovem adulta, foi para Belo Horizonte, estudar Ciências Atuariais na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O curso de nome complicado é voltado para a análise de riscos e expectativas de seguros e previdências, com conhecimentos das matemáticas estatística e financeira. “Na época eu não sabia o que ia fazer ainda, tava pensando em uma questão financeira, pensando que não dava pra viver na arte e cultura…”, comenta ela que, aos 26 anos, está consolidando uma carreira no segmento cultural.
Mas como a pessoa é para o que nasce, em BH Bruna se envolveu com eventos de arte e cultura, não só produzindo, mas também propondo e escrevendo. Da experiência em terras mineiras resolveu circular pela América Latina, entrou em contato com outras linguagens, outros povos, idiomas e culturas. Na Argentina teve muitas experiências com eventos culturais e começou a se desenvolver enquanto artista: “Foi um período que isso se fortaleceu mais ainda. Fiz eventos de rua, feiras, intervenções artísticas… participava de um grupo de candombe, que é um ritmo afro-uruguaio e a gente manifestava na rua, fazia ações sócio-culturais, tive uma banda de mulheres LGBTQIAP+”, e emenda, “mas sentia falta do Brasil”.
A ideia de retorno à própria pátria e cidade de origem vinha com uma condição: conseguir trabalhar e manter-se daquilo que alimenta e estrutura não só o seu corpo físico. “Se eu não fosse trabalhar com arte e cultura em São Paulo eu tinha certeza que eu não ia ficar. E aí eu conheci o PJMC através de uma colega da capoeira e foi isso, me encontrei”, diz Gomes.
Com um ano de experiência no programa, na edição 2019-2020, atuando no Centro Cultural Tendal da Lapa, a jovem foi contratada para ser produtora do espaço. A confiança na atuação de Bruna se consolidou e no primeiro semestre de 2022, aos 26 anos, a mesma foi convidada a ser coordenadora de produção do Tendal. “A minha trajetória tem sido linda, porque eu fui contratada pelo próprio equipamento em que eu atuava. Fui crescendo, era uma coisa que eu não imaginava antes de entrar no programa, que eu poderia estar na gestão do espaço, fazer parte disso, colocando as coisas que eu acredito, levando pessoas da quebrada, que eu sempre quis que estivessem ocupando esses espaços, então tem sido muito linda essa experiência”, relata ela.
Bruna percebe que curiosidade e dedicação são dois pontos fortes que vêm compondo seu caminho. “No PJMC eu desenvolvi muitas coisas na área de produção, aprendi muito sobre montagem dos equipamentos de som, de luz, operar, atendia o público de várias idades, tinha esse lado um pouco pedagógico, porque eu também sou arte-educadora, então desenvolvi mais atividades com crianças… fui entendendo sobre organização do espaço, de onde colocar as coisas, como receber o público em dia de evento, a trajetória toda…”, recorda.
À frente da produção do espaço cultural da Lapa, Bruna tem ciência do desafio e responsabilidade de sua função, mas leva consigo muitas aspirações. “Tendo sido jovem monitora, sempre penso sobre como é estar no outro lugar, como faço pra trazer uma melhor formação pra equipe, como eu posso motivar e incentivar as pessoas a acreditarem mais na arte e na cultura e de lutar por isso, ocupar os equipamentos culturais, ver que é possível”, comenta Gomes.
A ex-JMC comenta que a experiência no PJMC a fez perceber a importância de entender o território, entender o impacto que o equipamento cultural tem em uma região e de que forma ela poderia trabalhar com o panorama existente para democratizar e potencializar o Tendal. “Meu maior sonho é ver muito povo preto, indígena e pessoas LGBTQIAP+ ocupando todos esses espaços culturais, pessoas da periferia, que essas pessoas todas tenham suporte para lidar com as questões burocráticas e sejam pagas por todo o trampo delas, que estejam ocupando esses espaços”, reflete Bruna.
A coordenadora de produção do Tendal da Lapa também demonstra consciência do seu papel enquanto agente de transformação sócio-econômico-cultural, e de que se trata de um processo: “Onde eu quero chegar é difícil… eu gostaria mesmo que as pessoas pudessem acessar a cultura perto de casa, sem ter limitações, que pudesse também se envolver, saber que existe a possibilidade de trabalhar com uma coisa que você ama, de se encontrar, se identificar nos espaços, nas linguagens, e isso é um trabalho muito longo. Espero um dia poder fazer isso, poder ver as pessoas da quebrada tendo oportunidade de crescer no meio cultural”.